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quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Para começo de conversa - 6 21/09/2011

Entrevista publicada esta semana na revista FelizCidade, da Primeira Igreja Batista de São José dos Campos - SP, me chamou atenção. A ex-deputada federal Ângela Guadagnin (PT-SP) ocupa espaço editorial da revista para falar sobre a sua religiosidade, sua crença e sobre política. A senhora Ângela Guadagnin foi a protagonista da "dança da pizza" ou "dança da impunidade!" no plenário da Câmara Federal em Brasília, na sessão que se prolongou até a madrugada de 23 de março de 2006, para a votação da cassação do deputado federal João Magno (PT-SP), envolvido no escândalo do mensalão.

A parlamentar da "dança da pizza"

A médica carioca Ângela Guadagnin (PT) vive ha muitos anos em São José dos Campos - SP. Nessa cidade milita politicamente. Foi vereadora, prefeita e deputada federal pelo PT. Atualmente exerce novamente a vereança na cidade. Mas o episódio mais constrangedor da vida pública de Ângela Guadagnin foi a sua "dança da pizza" ou "dança da impunidade", aquela que praticou no plenário do Congresso Nacional, em março de 2006. O Brasil assistiu e se indignou com o comportamento escandaloso, grotesco e inconsequente da deputada federal. Uma cena deprimente e constrangedora.

Escândalo do Mensalão

Naquela época, 2005/2006, Ângela Guadagnin integrava a Comissão de Ética da Câmara e o Brasil inteiro se escandalizava com as propinas graúdas que enchiam os bolsos de partidos, políticos e autoridades do governo. O mensalão envolvia astuciosa e gigantesca rede de corrupção para a compra de votos de parlamentares. Beneficiavam-se o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, os partidos políticos da base aliada, parlamentares corruptos, bancos e empresas de todas as grandezas. O presidente Lula afirmava nada saber, invariavelmente. Mas a grossa contravenção permitiu ao Partido dos Trabalhadores se favorecer do desvio de dinheiro público para pagar periodicamente propina a parlamentares da base aliada do governo.

Um livro é pouco para historiar o mensalão

O escândalo do mensalão se arrasta até hoje, praticamente, e está provado e comprovado em todas as instâncias. Parlamentares perderam o mandato, ministros e assessores diretos do presidente Lula saíram do governo, bancos e empresas ficaram expostos por participarem da rede de corrupção, a Polícia Federal investigou e o Supremo Tribunal Federal acolheu o manancial de acusações. Mais não pode ser feito para o esclarecimento total do escândalo, graças ao empenho e ao trabalho diligente dos partidos e dos políticos envolvidos, com o apoio de advogados que manipulam a lei. Eles aviltaram todos os procedimentos morais e éticos. Foi a imprensa que levantou a ponta do tapete que escondia toda a sujeira corrupta do mensalão, a partir das imagens de pagamento de propina nos Correios. O deputado federal Roberto Jefferson, presidente do PTB -- partido altamente comprometido no recebimento de propinas --, se encarregou de alardear o grosso do escândalo político, acusando o então Ministro Chefe da Casa Civil, José Dirceu, de ser o mentor do mensalão. A partir de então o escândalo se maturou de maneira incontestável para ficar exposto à nação e ao povo brasileiro. No mesmo pacote da corrupção ficaram relacionados os escândalos dos Correios, Bingos e o caso Celso Daniel -- prefeito petista de Santo André - SP, assassinado misteriosamente. Nomes de autoridades e de parlamentares envolvidos são tantos e o gigantismo da rede de corrupção tão fantástico e intrincado, que um livro é pouco para ser registrada essa história. Ela compromete o exercício partidário e político no Brasil e envergonha o cidadão de bem.O pior é que a prática da propina não está banida. É persistente na política brasileira, no governo federal, nos Estados e municípios. O último caso mais visível é o do DEM em Brasília.

Para não se esquecer

Na Câmara Federal foram denunciados diversos parlamentares favorecidos com as propinas que ajudavam a salvaguardar atos governamentais e a engordar cofres das campanhas políticas. Entre os parlamentares estava o deputado federal João Magno (PT), que deveria ser cassado, mas se livrou do pior. E a deputada federal Ângela Guadagnin, mesmo participando da comissão de Ética da Câmara e diante de todas as evidências, não teve pruridos de comemorar o resultado da votação parlamentar, dançando em plenário. As imagens do ridículo, o Brasil e o mundo viram. João Magno é réu confesso: confirmou ter recebido propina do mensalão. O escândalo do mensalão pode ser considerado o maior e mais desavergonhado esquema de propina e corrupção estabelecido no governo e no Congresso Nacional, envolvendo políticos, autoridades, prefeitos, ministros, partidos e empresas de todas as grandezas. Ângela Guadagnin foi conivente com o escândalo.

A deputada cai em desgraça

Apesar de não envolvida no mensalão, Ângela Guadagnin é afastada por um dia do Conselho de Ética da Câmara, punida pela sua conduta na "dança da pizza". Depois foi censurada formalmente pelo presidente da Câmara, Aldo Rebelo (PC do B - SP). No dia 9 de maio pediu o “afastamento definitivo” ao renunciar ao Conselho de Ética. Ela discursou e se declarou “magoada” com a hipocrisia da imprensa e de alguns parlamentares. Magoou-se sem razão, diante da sua conduta imprópria e conivente com os escândalos todos aflorados. Passados mais de cinco anos, a senhora Ângela Guadagnin teve nova chance de explicar a sua conduta, nas páginas 7 e 8, edição 11, Nª 38 da revista FelizCidade. Entretanto, é duvidosa a sua fala. Os editores da publicação receberam meus comentários, expostos a seguir.

Professar a fé não cala o fato


Causou-me profunda reflexão a entrevista realizada com a vereadora Ângela Guadagnin, publicada na última edição 11, Nº 38, da revista FelizCidade. A publicação não fugiu aos princípios e ideário daquilo que preconiza o seu editorial tão bem sintetizado, privilegiando o dito de Rui Barbosa ─ “A imprensa  é o dever da verdade” ─ e expondo que: “Não vamos  discutir aqui os ideologismos, mas sim deixar claro o papel da imprensa e ratificar o entendimento que a liberdade, verdade e canais abertos para posicionamentos e informações aos leitores são preceitos fundamentais do dever, de qualidade, respeitabilidade e da vida de um meio de comunicação”. Perfeito. 

O espaço editorial oportunizado para a ex-prefeita, ex-deputada federal e vereadora de São José dos Campos, Ângela Guadagnin, foi oportuno. Manifestou-se livremente. Todos os leitores de FelizCidade sabem agora que a médica e política faria tudo igual, “só não dançaria”, como integrante da Comissão de Ética no episódio da absolvição parlamentar do deputado federal João Magno, em 2006, no caso “Escândalo do Mensalão”. João Magno recebeu, sim, propina e confessou o crime publicamente, entretanto não foi cassado. Ângela Guadagnin foi a protagonista da cena mais ridícula e constrangedora ─ para não dizer infame ─ da vida parlamentar desta Nação, ao praticar a “dança da pizza” ou “dança da impunidade” naquela ocasião. Diz a vereadora que hoje ela se policia muito mais na sua atividade pública, mas repetiria a sua conduta como parlamentar em Brasília. Como deputada federal, afirma, “procurava colocar em prática todos os procedimentos de um estado democrático de direito, o que significa que uma pessoa não pode ser acusada sem antes ter sido julgada”. Tal afirmativa é falsa, manipula o ocorrido e até hoje, inacreditavelmente, a médica e política procura sustentar a inverdade. Com candura se diz “envolvida no processo”, ou seja, continua querendo fugir e escamotear a sua responsabilidade parlamentar. 

As entrelinhas da entrevista de Ângela Guadagnin, lamentavelmente, revelam que ela ainda sustenta a sua conduta de maneira inconsistente, demonstrando seu profundo descontentamento em relação à imprensa do país. Esta nunca julgou ou condenou a parlamentar Guadagnin. A imprensa noticiou e comentou fatos incontestáveis, bem como o da conduta da deputada federal, na ocasião, por ridicularizar acintosamente o povo e a Nação numa questão de propina tão grave e consistente que jamais será apagada da memória do povo brasileiro. Querer comparar a conduta vil e maléfica dos parlamentares que isentaram ─ como ela isentou ─ os envolvidos no “Escândalo do Mensalão” com aquelas praticadas hoje pelos políticos, absolvendo os ainda envolvidos em propinagens e corrupção, desmerece e desqualifica a pessoa pública e a cidadã Ângela Guadagnin. Sua postura ética é insustentável e inconveniente. Ela dizer hoje que a “mídia condena todo mundo sem dar o direito de julgamento, de defesa” é de uma leviandade comprometedora, pois o “Escândalo do Mensalão” está aí provado e comprovado. O ato que ela própria praticou é irreversível. 

Na ocasião, a então deputada federal fugiu, se escondeu e se omitiu. Ela sabia da gravidade da sua conduta. Deveria se pautar pela ética, pela moral e servir de exemplo no cargo que ocupava. Não quis ou não soube sustentar com argumentos convincentes a sua lamentável e questionável atuação parlamentar, que se revelou totalmente frágil, desrespeitosa, inconveniente e contrária aos valores morais e éticos relevados por qualquer cidadão de bem. Na ocasião, a então deputada federal defendeu a política venal, perversa, inqualificável, o compadrio político e, infelizmente, não soube honrar o parlamento brasileiro para tentar praticar mudanças necessárias à política nacional. A mobilização social para a moralização política persiste e Ângela Guadagnin parece continuar não dando a necessária e devida atenção para o fato. Mostra-se aferrada à conduta corporativista, subjuga-se aos ditames partidários e falseia os acontecimentos que não a engrandecem. 

É leviano afirmar-se que Ângela Guadagnin, como política, está a claudicar constantemente, mas o seu testemunho público pode ser considerado duvidoso e absolutamente questionável nas questões morais e éticas relevantes como a do “Escândalo do Mensalão”. Mostrar-se pessoa de fé e cristã a dignifica. Mas muitos dos seus atos praticados ao longo da vida pública não contribuem para honrá-la e engrandecê-la, quando ainda hoje a humildade e expiação dos erros se inserem como atributos necessários ao engrandecimento do ser humano. Em respeito à Nação e a todos os cidadãos de bem, a senhora Guadagnin poderia ter usufruído o tempo para realinhar coerências saudáveis, aquelas que todos esperam das personalidades e dos seus representantes públicos. Quem determinadamente escolhe a vida pública, jamais estará livre e isento dos erros e acertos que permanecerão para sempre registrados na história. A sociedade será sempre penalizada ou beneficiada com a conduta dos seus representantes. Mas há fatos que falam por si, mesmo que a pessoa professe em alto e bom som a intransigência da sua fé. O pior cego é o que não quer ver. E esta é uma questão humana, secular. Teria sido saudável saber da vereadora o realinhamento de conduta naquilo que a conduz pela vida política. Nada contra a sua fé e àquilo que a motiva como pessoa, desde que com ética em todas as instâncias. 

Carlos Karnas
20/09/11
Adendo

Como documento, abaixo artigo de minha autoria, escrito e publicado na imprensa nacional e regional em março de 2006, por ocasião da votação que livrou o deputado federal João Magno (PT-SP) da cassação. Nele destaco o comportamento da deputada federal Ângela Guadagnin ao festejar o episódio com a sua “dança da pizza” ou “dança da impunidade”. O ocorrido ficou conhecido nacional e internacionalmente para a tristeza da Nação e do povo brasileiro.

E a deputada dançou

E a médica deputada federal Ângela Guadagnin (PT-SP) dançou, quase uma dança tribal, desengonçada para um plenário comprometido, que deveria ser austero, respeitoso, nobre, justo, imaculado e à serviço do país: o Congresso Nacional. Ela festejou a impunidade explícita de deputado do seu partido João Magno. E as câmeras de televisão captaram o espetáculo solitário da deputada inconveniente, arraigada em princípios e ética absolutamente questionáveis, cumprindo o viés amargo de defender aquilo que não pode ser defendido diante do tamanho de provas inquestionáveis que recaem sobre os parlamentares envolvidos nos escândalos de propinas, o mensalão. Para o Vale do Paraíba, São Paulo e para a Nação, eis a postura infeliz de uma representante do povo, este, que só pode assistir com incredulidade tamanho gesto de desrespeito, quando valores nobres são defenestrados pelo corporativismo partidário e parlamentar. Viu-se nos últimos meses, valores morais festivamente pisoteados por quem emperrou o esclarecimento e a elucidação de fatos criminosos, por quem não prestou serviço isento e eficaz para salvaguardar a moral, a honestidade, honra e justiça na política, mesmo dentro de um Conselho de Ética Parlamentar. O que restou do partido político da deputada, seguramente, canta hosanas e aplaude o espetáculo deprimente de uma vitória absolutamente duvidosa de parlamentares comprometidos com o crime e que envolvem o atual governo. Mas o povo brasileiro, esta Nação, bem que poderiam presenciar gestos de maior magnitude cívica daqueles que são exibidos na confraria das pizzas. Talvez, liberta do comprometimento em gestão executiva, como ex-prefeita de São José dos Campos, a nobre deputada agora tenha maior desenvoltura para dançar descompassada, como títere, pois na administração pública cambaleou no seu protegido gabinete de trabalho, na prefeitura de São José dos Campos, onde imperou a fragilidade, a falta de energia, a atitude medrosa, insensata, até covarde e subserviente aos descomprometidos com o bem-estar da cidade. A carreira política da deputada pode ser favorável somente para as alas internas e sinistras do seu partido, nunca para o bem público, com o objetivo de dignificar o país e para honrar o voto do povo que a elegeu. O pedido de desculpas, pronunciado por sua assessoria, em nada desfaz o gesto praticado, carregado de intenção provocativa e malévola ingenuidade. Aliás, o que dizer mais da deputada? Onde está a sua grandiosidade pública e parlamentar? Ela existiu em algum momento? Na Caixa de Pandora da deputada, nem esperança sobrou. Dançou. E nós todos pagamos por isso. Até quando?

Carlos Karnas
23/03/06

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Para começo de conversa - 5 14/09/2011

Não há como não deixar de fazer duas observações políticas neste blog: uma sobre Caçapava e outra sobre Taubaté. Minha geografia habitacional e cidadã mistura-se às duas cidades.

Caçapava: desconfianças preocupantes

Finalmente surge movimento legislativo no sentido de se investigar, talvez com seriedade, a administração do prefeito Carlos Antônio Vilela (DEM). Há uma Comissão Especial de Inquérito para apurar a existência de cargos comissionados criados de maneira ilegal pelo atual prefeito. Outra CEI foi criada para apurar contratações de locação de veículos e máquinas, com doação final, feitas pela Prefeitura. Os vereadores da Câmara Municipal deverão apurar todo o processo de licitação e contratos, pois há suspeita de sérias irregularidades e má gestão do dinheiro público. Os veículos e máquinas poderiam ter sido comprados de fornecedores e não locados, com visível economia para Caçapava.

O estranho é ser de autoria de vereador do DEM, o mesmo partido do prefeito, o requerimento solicitando a abertura da última CEI. A população de Caçapava convive, há muito, com sérias desconfianças a respeito da administração de Carlos Vilela. São inúmeras as ações municipais que têm chancela duvidosa. Eficiência e moralidade não são mais qualidades que atestam a administração do atual prefeito. Não há obra e realização municipal que tenha a devida transparência e competente prestação de contas. Para o cidadão de Caçapava, são notórias as artimanhas e a truculência do prefeito, com o poder de mando que sempre exerceu junto aos vereadores. Carlos Vilela não suporta ser contrariado e mostra-se pegajoso aos benefícios que lhe convêm.

Uma severa auditoria na administração municipal está mais que na hora. A dignidade, ética, moralidade e respeito se impõem neste momento. Não há mais como o prefeito Carlos Vilela perpetuar seus conchavos a portas fechadas e longe do gabinete de trabalho, cujos interesses estão longe do domínio público ou voltados plenamente para o bem da população e para o necessário desenvolvimento do município.

Chegou o momento de os vereadores de Caçapava assumirem a verdadeira responsabilidade pública, com isenção, em respeito ao cidadão que aqui vive, paga seus impostos e espera comportamento digno dos seus representantes legislativos e do poder executivo. O histórico político em Caçapava não contribui muito para se ter certeza da confiabilidade das práticas do prefeito e das de determinados vereadores. Existem todas as desconfianças. Isso é perceptível e não há como negar.

As CEIs estabelecidas obrigam o sério e competente trabalho investigativo, com propósito de se chegar às últimas consequências. Não há mais como o cidadão de bem conviver com falcatruas, corrupção e manobras do administrador público, que lesam o município.

No início do mês, por exemplo, a Câmara Municipal aprovou as contas do executivo relativas a 2009. O parecer da Comissão de Finanças e Orçamento foi contra aos números apresentados pela Prefeitura. Os vereadores, por 6 votos a 4, rejeitaram o parecer e aprovaram as contas do prefeito Carlos Vilela. Uma votação apertada, convenhamos. Por esse e tantos outros fatos é que as desconfianças persistem.

Taubaté: voz sufocada para nada dizer

O confuso emaranhado da política taubateana merece atenção permanente. Não fosse a ridícula e sofrida administração do prefeito Roberto Peixoto (PMDB), as mazelas municipais não deveriam merecer maior crédito. Infelizmente, além do prefeito, alguns vereadores avançam nas suas falsas qualidades para aflorar ações constrangedoras que não podem ser bem entendidas pela população. O melhor panorama dos fatos está em duas mídias na internet: o blog de Irani Lima e o blog do Jornal Contato. Faço a sugestão de leitura do artigo "Voz sufocada para nada dizer".

sábado, 10 de setembro de 2011

Para começo de conversa - 4 10/09/2011

Na manhã do dia 11 de setembro de 2001 eu estava na cidade de Paraibuna, com três amigos, tentando viabilizar um empreendimento que teria sede empresarial naquela cidade. Paraibuna é pequena, simples e pacata. Fica às margens da rodovia dos Tamoios, que liga São José dos Campos, no Vale do Paraíba, a Caraguatatuba, no litoral norte paulista.

O cemitério

O único cemitério da cidade tem, no portal de entrada, a instigante mensagem: “Nós que aqui estamos por vós esperamos” – foi tema e título de filme curta-metragem, inclusive. Num restaurante, acompanhei pelas imagens de televisão os choques de aviões nas torres do World Trade Center em Nova Iorque. Depois os edifícios ruíram.

A informação norte-americana

Na mesma época eu fazia trabalho de editoração de publicações, em português e espanhol, para o Departamento de Estado do governo norte-americano, através do Federal News Service, com sede em Washington. Até setembro de 2002 convivi todos os meses com a temática patrocinada e de interesse dos Estados Unidos, relacionada aos ataques terroristas e desatadas pelo fundamentalista Osama Bin Laden. Percebi a avalanche de informações oficiais que convinham ao governo norte-americano, de George W. Bush, difundir através do Departamento de Estado, por meio das publicações destinadas à internet e às embaixadas e consulados daquele país. Documentos, relatos e depoimentos sintomáticos foram manuseados por mim, sem que eu pudesse interferir nos textos ou na edição. Também identifiquei documentação fotográfica impressionante dos ataques terroristas, que a mídia convencional não teve acesso e não publicou até hoje.

O artigo de hoje

Passados dez anos, convivemos com a avalanche informativa relacionada aos ataques terroristas às torres gêmeas de Nova Iorque e ao Pentágono. Resolvi escrever o artigo abaixo como exercício de reflexão. Talvez o terrorismo não tenha uma única cara e muito mais há para ser desvendado e entendido.

O artigo está publicado também no Coletivanet

Reflexão que não cala

Não foi o mundo, mas foram os Estados Unidos, como vítima, que souberam sustentar a seu favor e irradiar para o mundo o vigoroso marketing dos ataques terroristas que sofreram no 11 de setembro de 2001, uma terça-feira. A nação mais bélica que conhecemos, com a mesma eficiência soube camuflar e manipular, entretanto, todos os seus não menos violentos ataques terroristas praticados em diversas outras nações e continentes, que causaram destruição e mortes em maior grandeza por décadas. Posturas ideológicas e de liberdade servem para sustentar as ações terroristas, mas por trás há retaliação. Há outro sistema nervoso e ganancioso que interfere, guerreia, incita atos bélicos para se manter ativo; que estende tentáculos de dominação. Ele pratica discurso em defesa da paz, de ação humanitária e de defesa das instituições democráticas misturado ao político, econômico e ideológico que, por todas as razões conhecidas, não consegue mais ter a simpatia pacífica dos povos nos tempos contemporâneos. Esse sistema é seriamente questionado, mas a brutalidade humana não estabelece fronteiras.


Os atentados relembrados hoje não diferem de outros que marcaram a história universal. A América Latina e o Brasil sofreram com o terrorismo, nas ditaduras militares, especialmente no período da Operação Condor. A Operação Condor foi uma articulação multinacional do terror das ditaduras militares do Cone Sul das Américas, entre as forças de repressão do Brasil, Argentina, Uruguai, Chile, Paraguai e Bolívia para o sequestro, tortura, assassinato e desaparecimento de opositores às ditaduras militares. Dela participaram ditadores, comandantes militares e agentes civis dos seis países, com apoio determinado e decisivo dos Estados Unidos. Foi montada no início dos anos 1970 e durou até o movimento de redemocratização, na década seguinte.


Agora, neste 11 de setembro, dez anos depois dos ataques às torres do World Trade Center e Pentágono, a humanidade está envolvida por fantástica e fabulosa mídia que consegue vitimizar ainda mais os Estados Unidos. São amortecidos outros efeitos danosos globais que não dão trégua à exploração, à fome e à miséria no nosso território e no mundo. Riquezas culturais, sociais e recursos naturais dos países continuam sendo solapados pela força capitalista e pela ação descomunal dos Estados Unidos, que não medem limites e gastos para guerrear e intervir naquilo que não lhes é de direito. Aferram-se à duvidosas justificativas diante do mundo globalizado, cujos reflexos atingem o cidadão comum de todos os continentes. A dinâmica das comunicações hoje em dia se encarrega da potente ação panfletária para relembrar o ato horroroso de 2001. E a mídia se rende sem ao menos questionar inúmeros outros horrores mundiais praticados, e latentes, pela nação que é endeusada como vítima.


Num mesmo 11 de setembro, também terça-feira, mas de 1973, uma esperança democrática latino-americana ruiu pelo terrorismo. Sonhos foram assassinados com a queda de Salvador Allende, presidente do Chile. Allende foi médico e político marxista. Primeiro presidente de república e o primeiro chefe de estado socialista marxista eleito democraticamente na América Latina, presidiu o Chile de 4 de novembro de 1970 a 11 de setembro de 1973, quando foi deposto por um golpe de estado liderado por seu chefe das Forças Armadas, Augusto Pinochet, com o apoio irrestrito dos Estados Unidos. Allende se matou para não ser humilhado. Ele, como muitos, só queria o seu país mais justo, generoso e digno.


Fanáticos e irados poderão defender o horror do terrorismo. Há diversas maneiras de se entender o terrorismo. A prática, entretanto, é sempre agressiva, destruidora, vitima invariavelmente inocentes e faz sofrer. Há os que fazem e os que são penalizados. É violência universal e cotidiana com consequências desastrosas, indeléveis, como o da violência do crime comum praticado ao cidadão na rua, na sua casa, no seu bairro, na sua cidade. Ou como a injustiça. A humilhação também, especialmente a prepotente, emanada por governantes e autoridades e facções do poder que desestabiliza povos e nações. A instabilidade e o cenário da economia mundial não deixa de ser um terror, bem como todas as demais intolerâncias atuais. Eis a realidade persistente que aflora, para impacientar a humanidade e para dizer que o mundo não é mais o mesmo.


Foram os Estados Unidos que em 11 de setembro de 2001 sentiram na alma, na carne, na cara e no bolso as terríveis consequências do próprio terrorismo que estão acostumados a praticar impunemente, valendo-se do discurso de salvadores do mundo. Foram humilhados tanto quanto humilharam e humilham povos que só querem dar tratos à sua própria independência, vontades e bem-estar. Não há conforto na crueldade e as tolerâncias se fragilizam nos povos desiguais. Mas os tempos contemporâneos não fazem despontar a verdade inabalável, talvez pelo fato de ela não existir. Do resto e escombros há que se fazer marketing dos novos monumentos que se erguem para enfeite e status do que não passa de símbolo. Sem distinções, é bom remexer a história para referenciar e homenagear heróis anônimos de tantas nações e ideologias, que só queriam e querem viver em paz e na justiça, defendendo ideais dignos. O ocorrido nos Estados Unidos no 11 de setembro de 2001 mudou o mundo, que continua e continuará mudando sem que a humanidade consiga preservar determinados valores morais e éticos, para viver feliz, com harmonia, justiça e verdade. A insegurança e a desconfiança são certezas diante do que é falso no mundo em que estamos.

Carlos Karnas
10/09/11

Este artigo foi publicado por Coletivanet em 12 de setembro de 2011

quinta-feira, 1 de setembro de 2011

Como ficam as ideias na cidade sem livrarias?

Convivo com a troca de ideias. São as que circulam entre amigos, companheiros de jornalismo e escritores, ativos ou eventuais. Correspondo-me com todos por e-mail, preferencialmente, também com os meus leitores. Nesse meio há o cuidado particular da não agressão à língua portuguesa e o esforço individual de não se atrofiar ou vandalizar demasiadamente a escrita, como está ocorrendo de forma crescente na internet. Portanto, existem pessoas que articulam pendores e determinada elegância na escrita, no uso das palavras, com o conteúdo das mensagens. Parece-me educado, estimulante e cativante esse exercício intelectual, de certa forma. Todas essas pessoas lêem livros.
Jamais me imaginei participando de alguma reunião formal de Academia de Letras, por exemplo. Pois aconteceu na última sexta-feira à tarde, 26 de agosto, justamente em Caçapava-SP, a cidade em que vivo e que me atêm. O convite partiu do acadêmico Brasilino Alves de Oliveira Neto, advogado, que deságua poesias e poemas no saite Recanto das letras. Ele também promove encontros de convivência para conversa fiada, no aconchegante espaço de lazer que mantém no local do seu escritório de advocacia. Foi o respeito às letras que nos aproximou há uns dois anos. E foi o fato de Brasilino ser atraído à leitura deste blog crítica & afago que o fez me convidar para a reunião da Academia.
A Academia Caçapavense de Letras completará quatro anos no próximo dia 8 de outubro. É associação civil de pouca idade, presidida pela acadêmica Lourdes Mesquita de Siqueira. Acompanhei a reunião mensal dos acadêmicos e, como ouvinte, fui atraído pelos assuntos discutidos. Por fim, sem querer transgredir o perfil da reunião, tive a oportunidade de me apresentar como autor do livro “Um Quarto de Mil”, que reúne contos ficcionais breves de exatas 250 palavras e inédito na literatura brasileira. Esta obra ficcional foi idealizada e escrita em Caçapava, no sítio da Mata Pequena. Neste sítio me dedico ao ofício da escrita e produzo artigos para a imprensa. Fiz questão de deixar transparente a minha identificação com a cidade, por respeitá-la. No que escrevo e por onde ando, Caçapava é sempre chancelada. Afinal, tem população de 85 mil habitantes. É local da minha produção literária ou jornalística, mesmo eu vivendo na roça como eremita depois de ter sido cosmopolita. Eu a homenageio assim como ela já me homenageou em 14 de abril de 2009, na data do seu aniversário, em solenidade na Câmara Municipal (ver o blog Teares e Medrares).
Mas, na reunião da Academia Caçapavense de Letras, um comentário me chamou atenção: Caçapava é cidade que não possui livraria. Nenhuma que venda livros. A que existia fechou e foi transformada em loja óptica no centro. Alguns poucos títulos – inexpressivos no mercado editorial – podem ser encontrados como subprodutos numa determinada locadora de vídeos, ou em escassas bancas de jornais. As ditas “livrarias” são na verdade papelarias de material escolar ou de artigos para escritórios. Portanto, a existência de Academia de Letras em Caçapava, cidade sem livrarias, é mérito emblemático. Talvez realidade pontual, ou constrangedora, a sinalizar a fragilidade e inexistência de ações culturais do poder público, também da iniciativa privada, para valorizar a literatura, fomentar a leitura na rede escolar e na comunidade. Então, um universo de iniciativas poderá ser colocado em prática para valorizar o livro e os novos autores, para circular ideias e pensamentos, promover obras ficcionais e não-ficcionais, os escritores, para oportunizar a venda de literatura. A Academia Caçapavense de Letras anuncia, inclusive, uma feira do livro mais para o final deste ano. Que ela seja bem-vinda.
O Sindicato Nacional dos Editores de Livros encomendou, este ano, pesquisa com 500 editoras. O censo inédito revelou que o setor de livros no Brasil é maior do que se supunha até agora. Constatou-se que há mercado para 4 bilhões de faturamento anual, 30% a mais do que se estimava. Ao mesmo tempo que essa informação era tornada pública, a edição 2.228 da revista Veja publicava o inquietante artigo “Poucos amigos”, do articulista J. R. Guzzo. Nele, Guzzo afirma que “a leitura de livros, ou de qualquer coisa escrita, não parece estar num bom momento no Brasil de hoje. (…) A leitura está a caminho de se transformar num hábito do passado. Cada vez mais, no dia a dia, sua valorização é posta de lado – ou ‘relativizada’, como se diz”. O articulista menciona algumas situações em que o livro poderia figurar como elemento virtuoso: nas empresas e entre os seus executivos; no recrutamento de pessoas para saber o que o candidato está lendo; personagem de novelas de televisão lendo um livro; na publicidade de consumo. Eis algumas maneiras de o livro aparecer e a sua imagem ser difundida. Ao concluir o seu artigo, Guzzo escreve: “Naturalmente, ninguém se coloca hoje como inimigo dos livros; mas é certo que muitos se beneficiam com o fato de que a leitura, nestes dias, tem poucos amigos na praça. Quanto menos se lê, menos ideias são mantidas em circulação. Quanto menos ideias, menos espaço sobra para a discordância, a procura de alternativas e a fiscalização dos atos do governo”.
As anotações históricas revelam que o pior inimigo para a Igreja Católica foram os livros. Neles as pessoas ficavam sabendo de coisas que não sabiam, porque os padres não lhes contavam, e descobriam que podiam pensar por conta própria, em vez de aceitar que os padres pensassem por elas. “Os livros, ou, mais exatamente, a possibilidade de reproduzir de forma ilimitada palavras e ideias, foram a sua pedra fundamental”, escreveu Guzzo, aflorando a imagem social da França, de 200 anos atrás, descrita pelo escritor francês Stendhal (Henri-Marie Beyle), retratista da existência humana em sua época.
O cenário atual é inquietante. Portanto, exige a reflexão, o pensar. É difícil entender como uma cidade pode ser digna sem ter ao menos uma livraria e com acervo atualizado. O desconforto pode ser dramático para a população de Caçapava, desacostumada e não estimulada ao hábito da boa leitura de livros, na cidade que não possui livrarias, onde circulam jornais sem independência, imparcialidade e seriedade, que se deixam dominar por temas oficiais menores e de interesse da autoridade pública sovina para o bem comum. Um perigo político, social e cultural que faz embotar ideias e condicionar o cidadão à inércia mental. A contrapartida saudável é o desafio da prática civil, aquela exercida por cidadãos de bem e letrados que respeitam a literatura, os que podem honrar e dignificar a Academia de Letras da cidade para aprimorar a saudável circulação de ideias na coletividade. Assim é a prática da cidadania. Pelo menos isso, na falta do resto.

Carlos Karnas
31/08/11