VULTOS E
BILHETES
TORMENTOSOS
Do lixo do DOPS, papéis rasgados contam
uma história dos Anos de Chumbo
Do lixo do DOPS, papéis rasgados contam
uma história dos Anos de Chumbo
(As fotos com as reproduções dos bilhetes expostos
neste blog são de domínio e exclusividade do autor)
E x c l u s i v o e I n é d i t o
a imprensa não publicou adequadamente.
A prisão de frei Betto.
O manifesto político dos padres presos em novembro de 1969.
Um fato real dos Anos de Chumbo, 42 anos depois.
A reportagem resgatada por quem a vivenciou.
Faço aqui uma revelação documental. Poderá ser histórica dos “anos de chumbo” (1968-1975) da ditadura militar brasileira (1964-1985). É fato verdadeiro. Eu o descobri como jornalista, na madrugada de 11 de novembro de 1969. A prova: os bilhetes, manuscritos em pedaços de papéis rasgados e num envelope onde está visível o carimbo da Secretaria de Segurança Pública do Rio Grande do Sul.
Bilhetes da tormenta
Reproduzo os quatro bilhetes tormentosos, manchados de lágrimas, suor e sangue. Estão comigo há quase 42 anos. Gostaria de ter conservado os originais que ficaram sob domínio do jornal Zero Hora, de Porto Alegre, onde trabalhava. Desconheço o destino ou o fim deles. Não sei se ainda existem, se foram preservados e guardados em algum outro lugar, com alguém. O certo é que ficaram esquecidos, estão sumidos. Provavelmente foram desprezados ou destruídos por serem reveladores. Talvez tenham sido entregues às autoridades dos órgãos de repressão e combate ao terrorismo. Talvez à Igreja Católica. O fato é que eu conservei as fotos, reproduções fiéis dos quatro bilhetes escritos por religiosos presos no DOPS (Departamento de Ordem Política e Social) e resgatados por mim numa madrugada em que houve suspense, medo, perseguição e fuga de um repórter que tentou preservar a informação até às últimas consequências.
Marighella está morto
Os bilhetes são silenciosas testemunhas da primeira e maior operação do DOPS gaúcho após a morte do terrorista Carlos Marighella, em São Paulo, no dia 4 de novembro de 1969, uma terça-feira. Político e guerrilheiro brasileiro, Marighella foi um dos principais organizadores da luta armada contra o regime militar a partir de 1964. Com a morte do fundador da Ação Libertadora Nacional (ALN), o DOPS desencadeou a maior ofensiva de caça e prisão de pessoas consideradas subversivas em São Paulo, Rio e Rio Grande do Sul. Dezenas foram as prisões, especialmente de religiosos dominicanos da Ordem dos Pregadores, afinados com a Teologia da Libertação e que mantinham estreita ligação com os dirigentes das organizações de resistência à ditadura.
A prisão de frei Betto
Uma semana depois da morte de Marighella foram presos oito religiosos no RS. Entre eles o considerado preso mais importante do terror: Carlos Alberto Libânio Christo, frei Betto. Tinha 26 anos, era dominicano e estudava Teologia no Seminário Cristo Rei, na cidade gaúcha de São Leopoldo, próxima à Porto Alegre. Usava identidade falsa com o nome de Ronaldo Matos e era o responsável pelo “esquema de fronteiras” – expressão usada pelo DOPS – que facilitava a fuga de terroristas para Argentina e Uruguai. Um membro da TFP (Sociedade Brasileira de Defesa da Tradição, Família e Propriedade) foi responsável por delatar e apontar o lugar em que frei Betto se escondia: Piccinelli. (Veja reprodução do “Bilhete 1”)
A força da repressão
A rigorosa repressão praticada pelos órgãos de informação, no início de novembro de 69, foi articulada pelo delegado paulista Sérgio Paranhos Fleury, a partir da prisão de 23 pessoas no centro do país, entre elas doze seminaristas dominicanos e dois jornalistas, além de outros que sofreram tortura. Alvos de intensa investigação, os freis Fernando e Ivo foram obrigados a participar da emboscada contra Carlos Marighella, morto com quatro tiros. A ação policial na Alameda Casa Branca, no bairro paulistano dos Jardins, foi comandada pelos delegados Fleury e Rubens Cardoso de Mello Tucunduva.
Outro preso à época, Tito de Alencar Lima, frei Tito, escreveu sobre a sua tortura nos porões da chamada Operação Bandeirantes (OBAN), criada em julho daquele ano de 1969 pelo governador paulista Abreu Sodré para ampliar a repressão contra os que se opunham à ditadura militar. O documento de frei Tito se transformou em símbolo de luta pelos direitos humanos. Em 1971 foi deportado para o Chile e, sob a ameaça de novamente ser preso, fugiu para a Itália. Considerado frade terrorista, não encontrou apoio da Igreja Católica. De Roma foi para Paris, onde se exilou e recebeu apoio dos dominicanos. Traumatizado pela tortura que sofreu, frei Tito submeteu-se a um tratamento psiquiátrico. Seu estado mental era instável, vivendo agoniada alternância entre prisão e liberdade diante do passado. Aos 28 anos, suicidou-se nos arredores de Lyon, em 14 de agosto de 1974.
A Igreja na mira do DOPS
O delegado Fleury não participou diretamente das ações em Porto Alegre. Elas foram intensas nas primeiras duas semanas de novembro de 69. Horas antes da emboscada, tiroteio e morte do líder da ALN, Carlos Marighella, em São Paulo (4/11/69), o DOPS gaúcho realizara uma devassa no Seminário Cristo Rei de São Leopoldo para prender frei Betto. Ele conseguira fugir. A sua prisão ocorreu uma semana depois, pela delação de Piccinelli, da TFP. Todos os freis, seminaristas dominicanos e religiosos de congregações católicas, presos na segunda-feira (10/11/69), foram levados para a sede do DOPS de Porto Alegre. Ela ocupava parte do segundo andar do Palácio da Polícia, no bairro Azenha, com as janelas gradeadas voltadas para a Avenida Ipiranga.
Luzes e vultos fazem a notícia
No andar térreo do Palácio da Polícia funcionava o Plantão Central, com entrada pela mesma Avenida Ipiranga. Era por ali o único acesso ao interior do prédio, fora do horário normal de expediente. O Plantão Central concentrava todas as ocorrências policiais e acidentes de trânsito. Raramente havia movimentação noturna nas delegacias especializadas, especialmente no DOPS. Mas quando as luzes do segundo andar ficavam acesas, era sinal de algo sério estar ocorrendo. Pois as luzes acessas no andar do DOPS, na madrugada daquela terça-feira, me chamaram atenção.
Eu era repórter policial do jornal Zero Hora. A redação ficava na Rua Sete de Setembro, no centro decadente de Porto Alegre. Trabalhava sempre no plantão da madrugada e desde fevereiro daquele ano aquela era a minha primeira atividade como jornalista com carteira de trabalho assinada. A passagem pelo Plantão Central era obrigatória, na ronda policial do único jornal gaúcho que mantinha reportagem ativa nas madrugadas.
Da rua não dava para identificar os vultos que se movimentavam numa das salas do DOPS. Determinei ao motorista da camioneta Rural Willys de cor azul, com grande letreiro do jornal pintado de branco na lateral, que estacionasse na vaga disponível em frente ao Plantão Central. A prática do jornalismo, naquela época, sempre estava a exigir cuidado e muita persistência na busca de notícia. Não consegui qualquer brecha de informação da movimentação no DOPS, na primeira conversa com os policiais plantonistas. Tentei subir a escadaria lateral interna que levava aos andares superiores do Palácio da Polícia. No meio do caminho havia resistente portão gradeado. Estava trancado com cadeado para impedir a passagem. Mas daquele ponto era possível ouvir vozes, sons de agressões e abafados gritos de quem estivesse sendo interrogado. Detive-me no local e afloraram as minhas cautelas. Não havia dúvida de alguma atividade decisiva nas dependências do DOPS. Entretanto, o melhor ponto de visão para o andar com luzes acesas era da calçada externa. Combinei com o repórter fotográfico que me acompanhava, Shigueru Nagassawa, que fosse para o lado mais escuro da Avenida Ipiranga e tentasse captar, com a teleobjetiva da sua Minolta 35mm, imagens de pessoas no DOPS. Eu fiquei encostado na camioneta observando atentamente a movimentação no segundo andar.
Mensagens pela janela
Alguém, então, se aproximou da janela que dava para a Avenida Ipiranga e olhou para baixo. Certamente identificou o carro do jornal e me viu ali encostado. Esse alguém, um homem, me fez sinais disfarçados com as mãos. Eu não conseguia ver nitidamente o seu rosto na contraluz, entretanto percebia o seu nervosismo e seus pulsos algemados. Ele gesticulava a boca tentando pronunciar algo sem emitir som. A escuridão da madrugada e a distância não nos favoreciam, e a dez passos de onde estava havia os policiais do Plantão Central em constante movimento. A gesticulação do que estava à janela era decidida e extremamente nervosa, talvez desesperada para chamar atenção ou pedir socorro. Num instante ele desapareceu. Dois outros vultos apareceram no lugar dele. Insistiram com gestos para que eu permanecesse naquele lugar em que estava, junto ao meio fio da avenida. Minutos depois, o homem que havia sumido retornou e jogou para fora um pequeno pedaço de papel amassado que caiu rente a parede do prédio, na terra da floreira de um metro de largura que circundava parte do prédio do Palácio da Polícia. Observei o movimento na calçada e a rua com cuidado. Sem ninguém por perto, corri e vasculhei a floreira malcuidada repleta de baganas de cigarro, lixo e papéis, até conseguir identificar o bilhete. Outro, em seguida, foi jogado na minha direção. Recolhi-os rapidamente. No interior do veículo do jornal, com a fraca e amarelada luz do painel, desdobrei os papéis amassados e consegui ler duas mensagens escritas a mão, apressadamente, em letra de forma:
Bilhetes da tormenta
Reproduzo os quatro bilhetes tormentosos, manchados de lágrimas, suor e sangue. Estão comigo há quase 42 anos. Gostaria de ter conservado os originais que ficaram sob domínio do jornal Zero Hora, de Porto Alegre, onde trabalhava. Desconheço o destino ou o fim deles. Não sei se ainda existem, se foram preservados e guardados em algum outro lugar, com alguém. O certo é que ficaram esquecidos, estão sumidos. Provavelmente foram desprezados ou destruídos por serem reveladores. Talvez tenham sido entregues às autoridades dos órgãos de repressão e combate ao terrorismo. Talvez à Igreja Católica. O fato é que eu conservei as fotos, reproduções fiéis dos quatro bilhetes escritos por religiosos presos no DOPS (Departamento de Ordem Política e Social) e resgatados por mim numa madrugada em que houve suspense, medo, perseguição e fuga de um repórter que tentou preservar a informação até às últimas consequências.
Marighella está morto
Os bilhetes são silenciosas testemunhas da primeira e maior operação do DOPS gaúcho após a morte do terrorista Carlos Marighella, em São Paulo, no dia 4 de novembro de 1969, uma terça-feira. Político e guerrilheiro brasileiro, Marighella foi um dos principais organizadores da luta armada contra o regime militar a partir de 1964. Com a morte do fundador da Ação Libertadora Nacional (ALN), o DOPS desencadeou a maior ofensiva de caça e prisão de pessoas consideradas subversivas em São Paulo, Rio e Rio Grande do Sul. Dezenas foram as prisões, especialmente de religiosos dominicanos da Ordem dos Pregadores, afinados com a Teologia da Libertação e que mantinham estreita ligação com os dirigentes das organizações de resistência à ditadura.
A prisão de frei Betto
Uma semana depois da morte de Marighella foram presos oito religiosos no RS. Entre eles o considerado preso mais importante do terror: Carlos Alberto Libânio Christo, frei Betto. Tinha 26 anos, era dominicano e estudava Teologia no Seminário Cristo Rei, na cidade gaúcha de São Leopoldo, próxima à Porto Alegre. Usava identidade falsa com o nome de Ronaldo Matos e era o responsável pelo “esquema de fronteiras” – expressão usada pelo DOPS – que facilitava a fuga de terroristas para Argentina e Uruguai. Um membro da TFP (Sociedade Brasileira de Defesa da Tradição, Família e Propriedade) foi responsável por delatar e apontar o lugar em que frei Betto se escondia: Piccinelli. (Veja reprodução do “Bilhete 1”)
A força da repressão
A rigorosa repressão praticada pelos órgãos de informação, no início de novembro de 69, foi articulada pelo delegado paulista Sérgio Paranhos Fleury, a partir da prisão de 23 pessoas no centro do país, entre elas doze seminaristas dominicanos e dois jornalistas, além de outros que sofreram tortura. Alvos de intensa investigação, os freis Fernando e Ivo foram obrigados a participar da emboscada contra Carlos Marighella, morto com quatro tiros. A ação policial na Alameda Casa Branca, no bairro paulistano dos Jardins, foi comandada pelos delegados Fleury e Rubens Cardoso de Mello Tucunduva.
Outro preso à época, Tito de Alencar Lima, frei Tito, escreveu sobre a sua tortura nos porões da chamada Operação Bandeirantes (OBAN), criada em julho daquele ano de 1969 pelo governador paulista Abreu Sodré para ampliar a repressão contra os que se opunham à ditadura militar. O documento de frei Tito se transformou em símbolo de luta pelos direitos humanos. Em 1971 foi deportado para o Chile e, sob a ameaça de novamente ser preso, fugiu para a Itália. Considerado frade terrorista, não encontrou apoio da Igreja Católica. De Roma foi para Paris, onde se exilou e recebeu apoio dos dominicanos. Traumatizado pela tortura que sofreu, frei Tito submeteu-se a um tratamento psiquiátrico. Seu estado mental era instável, vivendo agoniada alternância entre prisão e liberdade diante do passado. Aos 28 anos, suicidou-se nos arredores de Lyon, em 14 de agosto de 1974.
A Igreja na mira do DOPS
O delegado Fleury não participou diretamente das ações em Porto Alegre. Elas foram intensas nas primeiras duas semanas de novembro de 69. Horas antes da emboscada, tiroteio e morte do líder da ALN, Carlos Marighella, em São Paulo (4/11/69), o DOPS gaúcho realizara uma devassa no Seminário Cristo Rei de São Leopoldo para prender frei Betto. Ele conseguira fugir. A sua prisão ocorreu uma semana depois, pela delação de Piccinelli, da TFP. Todos os freis, seminaristas dominicanos e religiosos de congregações católicas, presos na segunda-feira (10/11/69), foram levados para a sede do DOPS de Porto Alegre. Ela ocupava parte do segundo andar do Palácio da Polícia, no bairro Azenha, com as janelas gradeadas voltadas para a Avenida Ipiranga.
Luzes e vultos fazem a notícia
No andar térreo do Palácio da Polícia funcionava o Plantão Central, com entrada pela mesma Avenida Ipiranga. Era por ali o único acesso ao interior do prédio, fora do horário normal de expediente. O Plantão Central concentrava todas as ocorrências policiais e acidentes de trânsito. Raramente havia movimentação noturna nas delegacias especializadas, especialmente no DOPS. Mas quando as luzes do segundo andar ficavam acesas, era sinal de algo sério estar ocorrendo. Pois as luzes acessas no andar do DOPS, na madrugada daquela terça-feira, me chamaram atenção.
Eu era repórter policial do jornal Zero Hora. A redação ficava na Rua Sete de Setembro, no centro decadente de Porto Alegre. Trabalhava sempre no plantão da madrugada e desde fevereiro daquele ano aquela era a minha primeira atividade como jornalista com carteira de trabalho assinada. A passagem pelo Plantão Central era obrigatória, na ronda policial do único jornal gaúcho que mantinha reportagem ativa nas madrugadas.
Da rua não dava para identificar os vultos que se movimentavam numa das salas do DOPS. Determinei ao motorista da camioneta Rural Willys de cor azul, com grande letreiro do jornal pintado de branco na lateral, que estacionasse na vaga disponível em frente ao Plantão Central. A prática do jornalismo, naquela época, sempre estava a exigir cuidado e muita persistência na busca de notícia. Não consegui qualquer brecha de informação da movimentação no DOPS, na primeira conversa com os policiais plantonistas. Tentei subir a escadaria lateral interna que levava aos andares superiores do Palácio da Polícia. No meio do caminho havia resistente portão gradeado. Estava trancado com cadeado para impedir a passagem. Mas daquele ponto era possível ouvir vozes, sons de agressões e abafados gritos de quem estivesse sendo interrogado. Detive-me no local e afloraram as minhas cautelas. Não havia dúvida de alguma atividade decisiva nas dependências do DOPS. Entretanto, o melhor ponto de visão para o andar com luzes acesas era da calçada externa. Combinei com o repórter fotográfico que me acompanhava, Shigueru Nagassawa, que fosse para o lado mais escuro da Avenida Ipiranga e tentasse captar, com a teleobjetiva da sua Minolta 35mm, imagens de pessoas no DOPS. Eu fiquei encostado na camioneta observando atentamente a movimentação no segundo andar.
Mensagens pela janela
Alguém, então, se aproximou da janela que dava para a Avenida Ipiranga e olhou para baixo. Certamente identificou o carro do jornal e me viu ali encostado. Esse alguém, um homem, me fez sinais disfarçados com as mãos. Eu não conseguia ver nitidamente o seu rosto na contraluz, entretanto percebia o seu nervosismo e seus pulsos algemados. Ele gesticulava a boca tentando pronunciar algo sem emitir som. A escuridão da madrugada e a distância não nos favoreciam, e a dez passos de onde estava havia os policiais do Plantão Central em constante movimento. A gesticulação do que estava à janela era decidida e extremamente nervosa, talvez desesperada para chamar atenção ou pedir socorro. Num instante ele desapareceu. Dois outros vultos apareceram no lugar dele. Insistiram com gestos para que eu permanecesse naquele lugar em que estava, junto ao meio fio da avenida. Minutos depois, o homem que havia sumido retornou e jogou para fora um pequeno pedaço de papel amassado que caiu rente a parede do prédio, na terra da floreira de um metro de largura que circundava parte do prédio do Palácio da Polícia. Observei o movimento na calçada e a rua com cuidado. Sem ninguém por perto, corri e vasculhei a floreira malcuidada repleta de baganas de cigarro, lixo e papéis, até conseguir identificar o bilhete. Outro, em seguida, foi jogado na minha direção. Recolhi-os rapidamente. No interior do veículo do jornal, com a fraca e amarelada luz do painel, desdobrei os papéis amassados e consegui ler duas mensagens escritas a mão, apressadamente, em letra de forma:
Bilhete 1: Frei Betto delatado pela TFP |
“Frei Beto foi preso às 6hs. Denunciado por Piccinelli da T.F.P.” (Bilhete 1).
Bilhete 2: Documentos do Vaticano apreendidos |
“Na busca foram apreendidos documentos secretos da Secretaria de Estado do Vaticano”. (Bilhete 2).
A grafia das letras indicava que os bilhetes foram escritos por pessoas e com canetas esferográficas diferentes. Presumi facilmente que as pessoas presas e algemadas estavam confinadas numa sala momentaneamente sem vigilância. No descuido policial, conseguiram recolher papéis rasgados de um cesto de lixo. Com as canetas que estavam em cima de uma velha escrivaninha de madeira, escreveram rapidamente aquelas mensagens para depois jogá-las pela janela.
Fiz sinal para o meu colega do outro lado da avenida se aproximar. Ele me confirmou que conseguira fotografar os vultos das pessoas na sala do DOPS e o momento em que um deles jogara o bilhete para mim. As condições de iluminação eram péssimas. A revelação exigiria trabalho laboratorial de puxar a sensibilidade do filme no banho químico e depois aumentar a exposição dos fotogramas na ampliação. O procedimento técnico de manipulação fotográfica exigiria cuidado e o laboratorista do jornal deveria ser informado. A responsabilidade ficou com Assis Hoffman, chefe do Setor Fotográfico de Zero Hora.
Mensagem para o cardeal
Do interior da camioneta voltei a observar a movimentação dos presos. Pareciam mais agitados. Dois personagens estranhos surgiram e empurraram com violência dois dos algemados que estavam de pé, próximos à janela. Gritos e xingamentos puderam ser ouvidos na rua. Depois silêncio. Um agente do DOPS olhou para a nossa direção e ficou nos observando por algum tempo. Eu e o meu colega saímos do veículo e nos encaminhamos para o interior do Plantão Central, tentando disfarçar e demonstrar como sendo corriqueira aquela nossa presença no local. Dez minutos depois, o motorista assustado veio ao meu encontro. Cochichou-me ao ouvido: “Jogaram mais dois bilhetes. Os caras foram descobertos. Saiu a maior pancadaria na sala de cima.”
Rapidamente nos encaminhamos para fora do Plantão Central. Na rua corri para procurar no canteiro os novos papéis que foram jogados da janela. O nervosismo talvez tenha me atrapalhado e demorei um tempo maior até encontrá-los. Voltei e entrei na Rural Willys. Abri e li os bilhetes. No papel menor estava escrito:
A grafia das letras indicava que os bilhetes foram escritos por pessoas e com canetas esferográficas diferentes. Presumi facilmente que as pessoas presas e algemadas estavam confinadas numa sala momentaneamente sem vigilância. No descuido policial, conseguiram recolher papéis rasgados de um cesto de lixo. Com as canetas que estavam em cima de uma velha escrivaninha de madeira, escreveram rapidamente aquelas mensagens para depois jogá-las pela janela.
Fiz sinal para o meu colega do outro lado da avenida se aproximar. Ele me confirmou que conseguira fotografar os vultos das pessoas na sala do DOPS e o momento em que um deles jogara o bilhete para mim. As condições de iluminação eram péssimas. A revelação exigiria trabalho laboratorial de puxar a sensibilidade do filme no banho químico e depois aumentar a exposição dos fotogramas na ampliação. O procedimento técnico de manipulação fotográfica exigiria cuidado e o laboratorista do jornal deveria ser informado. A responsabilidade ficou com Assis Hoffman, chefe do Setor Fotográfico de Zero Hora.
Mensagem para o cardeal
Do interior da camioneta voltei a observar a movimentação dos presos. Pareciam mais agitados. Dois personagens estranhos surgiram e empurraram com violência dois dos algemados que estavam de pé, próximos à janela. Gritos e xingamentos puderam ser ouvidos na rua. Depois silêncio. Um agente do DOPS olhou para a nossa direção e ficou nos observando por algum tempo. Eu e o meu colega saímos do veículo e nos encaminhamos para o interior do Plantão Central, tentando disfarçar e demonstrar como sendo corriqueira aquela nossa presença no local. Dez minutos depois, o motorista assustado veio ao meu encontro. Cochichou-me ao ouvido: “Jogaram mais dois bilhetes. Os caras foram descobertos. Saiu a maior pancadaria na sala de cima.”
Rapidamente nos encaminhamos para fora do Plantão Central. Na rua corri para procurar no canteiro os novos papéis que foram jogados da janela. O nervosismo talvez tenha me atrapalhado e demorei um tempo maior até encontrá-los. Voltei e entrei na Rural Willys. Abri e li os bilhetes. No papel menor estava escrito:
Bilhete 3: Devassa nas residências |
“Irmão Antonio Cechin, autor do catecismo aprovado pelos bispos, está sendo inquirido, tendo a residência devassada”. (Bilhete 3).
O quarto bilhete era um manifesto dos padres presos naquela noite e dirigido ao cardeal Dom Vicente Scherer, de Porto Alegre. Fora escrito num envelope em branco que continha o carimbo da Secretaria de Segurança Pública do RS, O texto dizia:
Bilhete 4: Manifesto político dos presos |
“Mensagem dos padres presos ao Cardeal Scherer”
“Aqui estamos, presos porque tivemos a coragem de correr o risco pelo nosso irmão, por uma imposição de consciência. Em todos os tempos a Igreja acolheu os perseguidos porque pessoas. Independente dos seus crimes pessoais ou supostos delitos políticos. Desconfiamos que ‘homens’ (grifado no original) da Igreja já não assumem hoje, com medo de comprometer seu prestígio, esta velha tradição da Igreja. Somos conscientes da nossa responsabilidade e da nossa fidelidade ao Evangelho”. (Bilhete 4).
O desafio jornalístico
A mensagem parecia inconclusa. Havia uma seta ao final sugerindo a continuação do escrito no verso do envelope rasgado numa das pontas. Quem escrevera a mensagem fora surpreendido e obrigado a interromper a redação naquele ponto, na palavra “Evangelho”. Mesmo assim, aquelas informações produzidas nas dependências do DOPS pararam em minhas mãos. E um novo desafio jornalístico se delineava: como levantar o conjunto dos fatos e publicar a matéria?
Solicitei ao repórter fotográfico que reproduzisse cada bilhete com a lente macro. Uma precaução. Assim teria registro duplicado daqueles documentos. Mas o flash da câmara foi denunciador na escuridão. Os policiais do DOPS perceberam da janela e gritaram para que ficássemos parados naquele lugar.
“Rápido. Vamos cair fora”, falei para o motorista Qualquer vacilo teríamos que dar explicações e certamente o equipamento fotográfico do jornal seria apreendido juntamente com os filmes e os bilhetes. A velha e pesada Rural Willys demorou a arrancar e ganhar velocidade na Avenida Ipiranga. Os veículos do jornal tinham tacógrafos instalados no painel e a velocidade máxima permitida era de 60 quilômetros horários. O nosso motorista cumpria rigorosamente a determinação do Setor de Transporte. Insisti para que ele desobedecesse a ordem um quarteirão adiante, ao notar a movimentação de carros da Polícia que estavam estacionados e saíram em nossa perseguição. Houve desesperada e maluca corrida de carros naquela madrugada em Porto Alegre. Contei cinco viaturas na nossa perseguição, apenas uma com antiquado giroflex vermelho no teto. Era impossível conseguirmos apoio do jornal àquela hora e naquela situação. No jornal permanecia apenas o vigia com o seu cigarro e café preto. Quando não cochilava atrás do balcão da portaria, escutava alguma programação da madrugada no seu acanhado radiozinho de pilha.
O cenário do jornalismo
Vale lembrar que estávamos dezenas de anos distantes da telefonia celular. Cabines públicas de telefonia eram raras na cidade e não funcionavam. Ligação para Rio ou São Paulo chegava a demorar horas e quase sempre necessitava do apoio de telefonista da Companhia Riograndense de Telecomunicações. Não havia discagem direta à distância. Não se imaginava a internet do futuro, o computador e muito menos o notebook ou iPad e tablet, a informática nas redações, a instantaneidade corriqueira das imagens da televisão e todas as demais facilidades de comunicação de hoje em dia. As redações dos jornais funcionavam com surradas máquinas Olivetti ou Remington, com muitas laudas das aparas de papel jornal e papel carbono para cópias das matérias. As notícias nacionais e internacionais chegavam pelos teletipos barulhentos das agências de notícia. O telex, de rolos amarelados de picotar para dar velocidade na transmissão, era valioso instrumento de envio e recebimento de informação. Nem fax existia. O jornalismo era praticado no bate-pernas mesmo, ao telefone ou em veículos velhos e cansados com roteiros programados para garantir o transporte de vários repórteres ao mesmo tempo. Tal realidade de trabalho no jornalismo era aflitiva. O tempo era de opressão e da censura de imprensa no regime da ditadura militar. Mas as dificuldades e condições precárias de comunicação eram semelhantes para todos, especialmente para os opositores da ditadura militar e participantes da guerrilha urbana.
A informação protegida
Naquela madrugada de terça-feira, 11 de novembro de 1969, eu mal imaginava a dimensão do fato que estava comigo. Não podia avançar rapidamente na investigação jornalística. O importante era a equipe se safar da perseguição do DOPS. Rodamos sem parar por quase uma hora. Embrenhamo-nos nas vilas e bairros periféricos da cidade, redutos de bandidagem que conhecíamos na reportagem policial. Percorremos aos solavancos vielas escuras, subimos morros com os faróis da camioneta apagados. Escondemo-nos em lugares de difícil acesso, mas com bom campo de visão para a movimentação noturna de carros. Tivemos sorte de não sermos encontrados. Havíamos despistado os policiais que nos perseguiram. Logicamente que era arriscado o retorno à redação do jornal no centro da cidade. Poderíamos ser surpreendidos. Decidi que os bilhetes e os filmes fotográficos deveriam ser entregues à minha chefia, ao jornalista Vilmo Medeiros, na casa dele. Cautelosamente nos movimentamos por rotas periféricas, por ruas de bairros pouco movimentados e longe das avenidas da cidade que encurtassem caminho. Fomos bem adiante do bairro Partenon e do Beco do Carvalho, para os lados da divisa com Viamão. Tivemos paciência para nos certificar que estávamos sozinhos no bairro e na rua em que Vilmo morava. Com cautela e determinada segurança recolhi os bilhetes e os filmes para entregá-los ao meu chefe e colega.
Passava das quatro da madrugada. Insisti ao bater na porta da casa do Vilmo. Com seu vozeirão sonolento perguntou quem era. Identifiquei-me e só então ele abriu a porta da sala. Falei rapidamente do ocorrido. Ele me mandou entrar e manteve as luzes da casa apagadas. Em voz baixa detalhei tudo o que descobrira e a perseguição do DOPS. Repassei o material que havia recolhido e os dois rolos de filmes para serem revelados. Prudentemente Vilmo me aconselhou a não voltar para a redação do jornal e que procurasse sair imediatamente do apartamento em que morava, na Avenida Pernambuco, no bairro Floresta. Eu deveria ficar afastado e longe da encrenca por enquanto. Despedimo-nos e redobrei a minha vigilância pessoal. Simultaneamente, o vigia noturno de Zero Hora percebeu movimentação exagerada de carros da polícia em frente do prédio da redação que ficava nos altos do cinema Rex, na Avenida Sete de Setembro. Três policiais procuraram saber com o vigia quem estava trabalhando na madrugada. Essa informação só ficou conhecida perto das nove horas da manhã.
A notícia sob pressão
Voltei impaciente à redação do jornal no começo da tarde. No espaço da reportagem policial, os contatos das fotos da madrugada estavam na segunda gaveta da mesa do Vilmo. Havia uma sequência de imagens com os vultos das pessoas que chegavam perto da janela do DOPS, outra de três fotos registrando o momento que um dos presos jogava um bilhete para fora da janela e por fim a sequência dos bilhetes reproduzidos. Houve intensa conversa a portas fechadas de Vilmo com a direção do jornal, exercida por Ary de Carvalho e Paulo Amorim. Também houve a presença de policiais na redação.
Naquela ocasião deixei de ter domínio e autoridade sobre a matéria. Fui instruído a redigi-la com os fatos que tinha apurado e eles remetiam a uma grande operação do DOPS gaúcho após a emboscada e a morte de Carlos Marighella. No sul, frei Betto era acusado de ter ligação com a subversão violenta e facilitava a fuga de ativistas para Argentina e Uruguai. Para o DOPS ele precisava ser preso definitivamente. Aconteceu na segunda investida dos órgãos de segurança, em menos de dez dias, que se valeram das informações de presos políticos em São Paulo repassadas pelo delegado Sérgio Paranhos Fleury para a polícia gaúcha. A delação feita pelo desconhecido Piccinelli da TFP foi decisiva para a prisão de frei Betto. Ele estava fora do seminário Cristo Rei de São Leopoldo. Toda a ação policial ficou concentrada nos nomes de seminaristas dominicanos e de outros padres. Apartamentos e casas onde se encontravam os procurados foram invadidos. Houve violência nas prisões. A violência continuou em interrogatórios nas dependências do DOPS.
A notícia comportada
O jornal Zero Hora do dia 12 de novembro publicou o fato. As manchetes de primeira página foram sustentadas nos dias seguintes. Uma semana depois a revista Veja (edição 63 de 19/11/69) publicou extensa mas cautelosa reportagem de capa, utilizando-se das informações que foram repassadas pela redação de Zero Hora para a sucursal da revista em Porto Alegre. A capa da revista estampou a manchete: “Os sacerdotes da violência” e ocupou 11 páginas internas para relatar a prisão de frei Betto, considerado o preso mais importante do terror. As fotos de Zero Hora foram cedidas para a Veja, mas não foram publicadas até hoje.
No dia em que ocorreram as prisões no RS, a revista Veja (edição 62) circulava com a reportagem da morte do terrorista Carlos Marighella. A manchete da capa lançava a pergunta: ”O terrorismo morre com Marighella?”. Em dez páginas internas destacava a reportagem “Estratégia para matar o terror” e deixava pressuposta forte ação dos órgãos de repressão contra os religiosos dominicanos. Foi o que aconteceu. Na edição seguinte, 63 de 19/11/69, a revista destacou fortemente a prisão de frei Betto no sul, o envolvimento do clero com organizações e líderes da guerrilha e a determinada violência da linha progressista da igreja. Também dedicou página inteira para Plínio Correia de Oliveira, presidente da Sociedade Brasileira de Defesa da Tradição, Família e Propriedade, difundir o seu catolicismo.
O fato com destino incerto
Não fossem as mensagens rápidas e determinadas, escritas em papéis amassados recolhidos do cesto de lixo em sala do DOPS e jogados pela janela para mim, muito provavelmente o destino de frei Betto, do religioso Antônio Cechin e tantos outros presos e torturados naquela madrugada de segunda-feira poderia ter sido diferente e para pior. Com tal documentação jornalística nas mãos, talvez tenha sido estorvo para subsequentes ações práticas dos órgãos de informação e de segurança naquela ocasião. Entretanto, profissional novo submisso à hierarquia das redações e dos jornais, mais não pude fazer à época. Oportunidades outras de publicação também foram desperdiçadas.
Sagrado cardeal em março daquele mesmo ano, Dom Vicente Scherer, a principal autoridade da igreja católica no RS não se manifestou publicamente. Talvez a mensagem política dos padres presos não tenha chegado até ele da maneira como deveria chegar. Fica a dúvida. Também ficou muda a informação contida num dos bilhetes, sobre a apreensão de documentos secretos do Vaticano. Continuam não revelados, sob sigilo do clero e do DOPS. Que documentos seriam esses? Ainda existem?
O fato movimentou reuniões fechadas na Cúria Metropolitana e na sede regional da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), que ficava na Rua Alberto Bins, em Porto Alegre. O modo de agir do cardeal Dom Vicente Scherer era extremamente silencioso diante das questões políticas e diante dos assuntos mais polêmicos da Igreja Católica. Ele não se expunha, não provocava e jamais fez declarações polêmicas sobre o posicionamento de segmento do clero que lançava críticas ao regime militar. Também não avançou em comentários sobre a Teologia da Libertação ou sobre a linha progressista da Igreja, que despontava com insistência e ousadia no final dos anos 60 e início dos anos 70. O cardeal gaúcho, religioso de rituais conservadores, foi um realizador de ações práticas que fundamentaram e administraram o patrimônio da Igreja Católica no sul. A vantagem de Dom Vicente Scherer era viver na Cúria Metropolitana, ao lado do Palácio Piratini, sede do governo gaúcho. O coronel da Brigada Militar, Walter Peracchi Barcellos, era o governador. Da sede do governo gaúcho também não saiu qualquer manifestação sobre a prisão dos religiosos. Na imprensa o texto do manifesto dos padres presos não foi publicado.
Três dias depois da prisão de frei Betto, o secretário de Segurança do RS, Jaime Miranda Mariath, armou cenário na sala do diretor do DOPS e fez a apresentação do preso: “Queremos que a imprensa comprove que ele está sendo bem tratado”, disse. Fotógrafos e cinegrafistas tiveram três minutos para as imagens daquele jovem que era considerado perigoso terrorista. Mas os doze repórteres presentes foram impedidos de fazer perguntas. Prevaleceu a informação da autoridade. Logo depois frei Betto foi transferido para São Paulo, sob domínio do delegado Fleury. Ficou preso até 1973.
O fato resgatado
Exponho os bastidores desta notícia e publico as fotos que tirei dos bilhetes para registrar o acontecimento jornalístico. Também determinada cena dramática de momento político gaúcho e brasileiro. É resgate de informação distante. Ela faz parte da história recente do país e sugere outra percepção do que aconteceu. No mínimo historia o fato por quem o descobriu. O material que ficou em minhas mãos não poderia ser facilmente exposto nos anos da ditadura militar.
Depois de tanto tempo essa documentação ficou extraviada nos meus próprios pertences. Minha atividade jornalística me levou para fora do RS e para muitos lugares. Entretanto, lampejos memoriais dos acontecimentos vez ou outra me importunaram. Sempre questionei o fato de os bilhetes não terem merecido maior e determinada atenção da mídia em que trabalhei. A imprensa poderia ter sido mais ousada nesse fato, naqueles tempos de repressão e censura, mesmo correndo seus riscos. Afinal, as prisões e os bilhetes existiam e havia registro fotográfico. A notícia poderia ser considerada “bomba” e o teor político e ideológico de um segmento da Igreja Católica era perceptível, na mensagem dos padres presos e dirigida ao cardeal Dom Vicente Scherer. As suspeitas de infiltração da direita dentro da Igreja Católica vinham à tona, por escrito, pela primeira vez. O jornal Zero Hora ousou, então, a valorizar as fotos e manchete de capa. Também enfrentava período editorial-empresarial difícil e início de negociação da transição para integrar a que seria Rede Brasil Sul (RBS) anos depois. Preferiu se restringir ao noticiário comportado e deixar que a mídia mais forte, do centro do país, se encarregasse da publicação com maior destaque e autoridade como pudesse.
Em novembro do ano passado (2010) estava em Porto Alegre e conversei na Feira do Livro – por ocasião do lançamento do meu livro “Um Quarto de Mil” – com alguns colegas jornalistas. Relembramos fatos e nomes de companheiros, os anos de repressão, falamos do Coojornal, do qual fui sócio fundador e conselheiro. Eu historiei essa prisão de frei Betto. Foi necessária a minha intervenção para esclarecer e realinhar como a informação original fora descoberta e exposta. Houve insistência para que eu resgatasse as mensagens contidas nos bilhetes, as provas de um acontecimento que entrou para a história.
Há poucos dias, uma dessas casualidades domésticas permitiu que isso acontecesse. Minha filha remexendo velhas, esquecidas e escondidas fotografias familiares se deparou com as fotos dos bilhetes. O material documental ressurgiu, enfim, permitindo-me desenvolver este relato. Consultei determinados amigos para não cair na traição da memória, entre eles o jornalista Fernando Albrecht, que hoje mantém coluna diária no Jornal do Comércio de Porto Alegre, e um participante ativo de acontecimentos daquela época, que vive na cidade paulista de Taubaté. Submeti esta reportagem-depoimento à leitura de outras pessoas próximas. O jornalista Irani Lima, que mantém polêmico blog político regional no Vale do Paraíba, leu o que escrevi e comentou: “Os bilhetes que você diligentemente guardou por mais de 40 anos revelam que a imprensa se acovardou na época e parte da Igreja não denunciou as torturas, o que era de seu dever. O material que você possui é peça importante no mosaico da repressão militar brasileira que ora se procura reavivar, para que não escape à nossa memória.”
De Brasília, amigo de longa data que vivenciou aqui e do exterior a repressão nos “anos de chumbo” escreveu-me: “Nunca saberemos tudo, mas temos o direito e o dever de saber o máximo.” Elimar Pinheiro do Nascimento, doutor em Sociologia, casado com uma irmã de Dom Marcelo Carvalheira, arcebispo emérito da Paraíba, lembrou-me que esse religioso católico também fora preso no Rio Grande do Sul e depois transferido para São Paulo. Naquele período, Dom Marcelo defendeu os líderes católicos perseguidos pelo regime militar. Foi confidente e um dos mais importantes colaboradores de Dom Hélder Câmara. O arcebispo emérito de Olinda e Recife e um dos fundadores da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil é outra referência na defesa dos direitos humanos durante o regime militar. Dom Hélder morreu em 27 de agosto de 1999. Pregava uma Igreja simples, voltada para os pobres e a não-violência. Por sua atuação, recebeu diversos prêmios nacionais e internacionais. Foi o único brasileiro indicado quatro vezes para o Prêmio Nobel da Paz. Entretanto, seus opositores o acusaram de ser conivente com o marxismo, ideologia considerada por segmento da hierarquia católica como sendo contrária aos princípios cristãos.
Os religiosos católicos nordestinos Hélder Câmara e Marcelo Carvalheira, juntamente com Paulo Evaristo Arns, atualmente arcebispo emérito de São Paulo, e Pedro Cassaldáliga, bispo espanhol radicado no Brasil em 1968, despontavam como evidentes críticos do regime militar. Outros nomes importantes se juntaram à eles. Todos defendiam os direitos humanos e a volta da democracia. Pregavam a não-violência, o fim da perseguição política e o fim da tortura. Participavam de atos públicos, expunham ideias e demonstravam com coragem a opção pelos trabalhadores, pelos pobres e oprimidos. Sempre defenderam a promoção dos direitos da pessoa humana. Portanto, serviram de exemplo e tiveram seguidores no clero jovem de tendência progressista e afinado às organizações de combate à ditadura. Foi esse segmento da Igreja Católica que assumiu postura ideológica e defendeu as comunidades eclesiais de base que fortaleceram o movimento social e operário brasileiro. O gradativo trabalho de conscientização política da população não agradava ao regime. Muitos religiosos e civis foram perseguidos, presos e torturados pelas forças da repressão. O que aconteceu em novembro de 1969 e aqui está relatado é típico dos “anos de chumbo”.
Há 42 anos comecei e hoje concluo esta matéria de maneira pontual, apenas relatando o fato e mostrando documentos, mensagens em papéis amassados e rasgados que, silenciosos, estão a afirmar: aconteceu desta maneira.
Os fatos novos
Há fato novo, entretanto, para justificar o que aqui está documentado: a criação da Comissão da Verdade, apoiada pelo governo da presidenta Dilma Rouseff e aprovada dia 21 de setembro deste ano pelos deputados federais em Brasília, para apurar violações aos direitos humanos entre 1946 e 1988. O projeto de lei diz que a Comissão não terá poderes para punir agentes da ditadura. As investigações incluem a apuração de autoria de crimes como tortura, mortes, desaparecimentos forçados e ocultação de cadáveres, perdoados com a Lei da Anistia, de 1979. A comissão terá dois anos para produzir um relatório com conclusões e recomendações. Durante as investigações, o grupo poderá requisitar informações a órgãos públicos, inclusive sigilosas, convocar testemunhas, realizar audiências públicas e solicitar perícias. A comissão terá ainda de enviar aos órgãos públicos competentes informações que ajudem na localização e identificação de restos mortais de pessoas desaparecidas por perseguição política.
Outra informação que me chega. Dois autores nacionais concluem publicações e nelas inserem nova dimensão ao fato que descobri e testemunhei como jornalista. Uma obra é produção intelectual sobre esse período específico. Na outra, pelo que sou informado, o autor desenvolve tese que, na minha opinião, poderá ser explosiva, preocupante e, talvez, perigosa: o grande responsável pela morte de Marighella foi... frei Betto.
“De qualquer forma, a História sempre agradece qualquer luz que ajude iluminar os fatos que sempre terão versões específicas, dependendo de quem escreve ou conta.” Esta frase fecha e-mail que recebi terça-feira (27/09/11) de Paulo de Tarso Venceslau, amigo e vizinho no Vale do Paraíba, verdadeiro participante e testemunha do ocorrido nos “anos de chumbo”. Ele sim tem memória e histórias para revelar.
1969. Ufa!
1969 foi diferençado, emblemático. Intenso de acontecimentos de todas as grandezas que continuam sendo lembrados e contados na visão, entendimento e grandiosidade de quem os vivenciou.
Naquele ano as naves norte-americanas Apollo 11 e 12 pousaram na Lua (julho e novembro) e o astronauta Neil Armstrong (20/07/69) foi o primeiro homem a nela pisar. Na Terra aconteceu o maior festival de rock and roll de todos os tempos, o Woodstock, nos dias 15, 16 e 17 de agosto, nos Estados Unidos.
O drama brasileiro
No Brasil, o ano foi marcado por algumas dramaticidades históricas. Houve diversas trocas de comando no Exército. Ao longo dos doze meses do ano foram constantes e inúmeras as solenidades de condecoração de militares por todo o Brasil. Por fim, o regime militar e o país se deparam com um grande problema: no dia 26 de agosto o presidente Arthur da Costa e Silva sofre uma trombose cerebral. Cinco dias depois o presidente é afastado por doença e o Brasil passa a ser governado por Junta Governativa Provisória, em 31 de agosto, composta pelos ministros Aurélio de Lira Tavares, do Exército; Augusto Rademaker, da Marinha; e Márcio de Sousa e Melo, da Aeronáutica. O AI-16 permitiu que o Congresso Nacional fosse reaberto para ser realizada sessão conjunta, em 25 de outubro, quando foi eleito o candidato da Arena, o general Emílio Garrastazu Médici. A posse do presidente Médici aconteceu logo em seguida, no dia 30 de outubro. Com ele assumiram Alfredo Buzaid, ministro da Justiça, e o general João Figueiredo, chefe da Casa Militar. O general Arthur da Costa e Silva, presidente de 1967 a 1969, morreu no dia 17 de dezembro daquele ano. Sucessivos Atos Institucionais impuseram regras severas para a sustentação do governo militar, que não deixou de ser surpreendido por ações da luta armada de esquerda.
Avalanche de Atos Institucionais
Dos dezessete Atos Institucionais decretados entre 1964 e 1969, regulamentados por 104 atos complementares, os doze últimos aconteceram justamente em 1969. Todos serviram como mecanismos de legitimação e legalização das ações políticas dos militares. Estabeleceram para eles próprios diversos poderes extra-constitucionais para, como pregavam, combater a "corrupção e a subversão".
Os Atos Institucionais de 69 endureceram ainda mais a vida política do país, que já estava com a Constituição Federal de 1946 revogada, o Congresso Nacional fechado, os partidos políticos extintos (foram instituídos apenas dois partidos: Arena e MDB) e vivia sob a censura e a proibição de manifestação política. O AI-5 (13/12/68) foi instrumento que deu ao regime poderes absolutos. Os subsequentes, em 69, enfraqueceram o Supremo Tribunal Federal; extinguiram a justiça de paz eletiva; suspenderam as eleições no Brasil; instituíram a administração por simples “Decretos”, dos Estados e municípios com mais de 200 mil habitantes; e decretaram o fechamento de emissoras de rádio pelo Dentel. Também avançaram ainda mais nas cassações de congressistas, deputados estaduais, vereadores e prefeitos; na punição e suspensão de direitos políticos de funcionários públicos, militares, jornalistas, diplomatas, médicos, advogados, professores e pesquisadores universitários com ideologias contrárias às do regime. Diante das ações armadas de organizações revolucionárias, consideradas subversivas e guerrilheiras, os últimos Atos Institucionais decretaram o banimento das pessoas “perigosas para a segurança nacional” e a pena de morte, por fuzilamento, nos casos de "guerra externa, psicológica adversa, revolucionária ou subversiva". Uma nova Lei de Segurança Nacional foi instituída.
Consequências
A consequência dos instrumentos de força foi a rigorosa censura e a ocupação militar das universidades brasileiras, além da proibição de filmes e peças teatrais, fotos, noticiário e reportagens, transmissão de rádio e televisão que mostrassem tumultos em que envolvessem estudantes, manifestações públicas e temas polêmicos no entendimento de censores dos órgão de informação do governo. Livrarias, bibliotecas e casas de intelectuais foram visitadas. Todos os livros que falassem sobre comunismo, socialismo ou reforma agrária eram apreendidos. Foi intensificada a caça aos comunistas e criada a Operação Bandeirantes (OBAN) em 01/07/69, pelo governador paulista Abreu Sodré, com o apoio e dinheiro de empresários brasileiros de direita. para capturar subversivos e terroristas. Houve significativo aumento de prisões e torturas, mortes e desaparecimentos de pessoas.
Luta armada
A luta armada e as ações terroristas de oposição ao regime militar foram intensificadas a partir de dissidências que aconteceram no Partido Comunista Brasileiro (PCB), Partido Comunista Brasileiro Revolucionário (PCBR), Partido Operário Trotskista (PORT), Política Operária (POLOP) e Organização Revolucionária Marxista (ORM). Carlos Mariguella, do PCB, morto em 04/11/69, consolidou e fundou o grupo armado Ação Libertadora Nacional (ALN) em fevereiro de 1968. A ALN liderou as principais ações terroristas no Brasil em 1969. Em torno da ALN gravitaram outras siglas de organizações terroristas: FLN (Frente de Libertação Nacional), MR-8 (Movimento Revolucionário 8 de Outubro), MR-26 (Movimento Revolucionário 26 de Março), Corrente, Ala Vermelha e a VAR-Palmares (Vanguarda Armada Revolucionária Palmares).
Na luta armada, as ações dos grupos de esquerda surpreenderam, mas as forças de segurança souberam revidar com violência:
16/01/69 – Estourados diversos “aparelhos” comunistas em diversos Estados. As forças de segurança informaram: “Infelizmente muitos terroristas não sobreviveram”
24/01/69 – Ataque e assalto ao Quartel do 4º Regimento de Infantaria, em Quitaúna, São Paulo. Carlos Lamarca, capitão do Exército Brasileiro, foge e leva grande quantidade de armas e munições para fortalecer a guerrilha.
07/05/69 – Terroristas assaltam o Banco Moreira Salles, em Suzano, São Paulo.
26/05/69 – Assassinado o padre Henrique Pereira Neto, auxiliar de Dom Hélder Câmara, durante ação armada.
18/07/69 – A guerrilha rouba o cofre do ex-governador paulista Adhemar de Barros. O dinheiro deveria ser empregado na luta contra a ditadura, pois era fruto dos atos de corrupção do ex-governador. Adhemar de Barros morrera em 13 de março do mesmo ano.
04/09/69 – Sequestro do embaixador norte-americano Charles Burke Elbrick, no Rio, por militantes da ALN e MR-8, que exigiram a leitura de carta-manifesto em rede nacional e liberdade para 15 presos políticos.
06/09/69 – Libertação de Charles Elbrick, trocado por 15 presos políticos que se exilaram no México. Entre eles Luís Travassos, José Dirceu e Vladimir Palmeira, líderes estudantis, e Flávio Tavares, jornalista.
07/10/69 – Assassinato do soldado PM Romildo Ottenio quando tentava prender um terrorista.
08/10/69 – Exército assume a responsabilidade pela morte do guerrilheiro Virgílio Gomes da Silva.
10/10/69 – Reestruturação do DOPS paulista para combater a subversão e o terrorismo.
16/10/69 – Agentes do DOI-CODI matam o estudante Eremias Delizoikov, no Rio de Janeiro.
28/10/69 – Sequência de dezenas de prisões, em São Paulo e Rio. A maioria freis dominicanos. Entre eles está frei Tito. Também são presos ativistas que participaram do sequestro do embaixador Charles Elbrick. O DOPS de São Paulo começa a obter informações e montar emboscada para Carlos Marighella.
04/11/69 – Morte de Carlos Marighella, fundador da Ação Libertadora Nacional, considerado o principal líder da luta armada.
10/11/69 – Prisão de frei Betto e de diversos religiosos no RS. Mensagem dos padres presos, para o cardeal gaúcho Dom Vicente Scherer, revela cunho político-ideológico de adeptos da Teologia de Libertação.
291169 – Sequestro de jato brasileiro, levado para Cuba com 95 pessoas a bordo.
O almanaque do ano
Revisar fatos e acontecimentos de 1969 é como folhear, de certa forma, pequeno almanaque. O músico e compositor Ataulfo Alves e a atriz Cacilda Becker morreram naquele ano. Um Decreto-Lei introduziu a disciplina de Educação, Moral e Cívica no ensino brasileiro. Foram criadas a ECT (Empresa Brasileira de Correio e Telégrafos), a Embraer (Empresa Brasileira de Aeronáutica), a Embrafilme e a Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz). A profissão de jornalista foi regulamentada naquele ano, o Jornal Nacional foi transmitido pela primeira vez pela Rede Globo, e em pleno regime de censura da imprensa é lançado o tabloide Pasquim. Por fim, em 19 de novembro, o brasileiro gruda o olho na televisão para ver o milésimo gol de Pelé.
A narrativa de Carlos Karnas parece roteiro de filme. O conteúdo da narrativa de Karnas parece obra de ficção. E para os jovens de hoje, o período da ditadura militar pode parecer algo vazio e inconsistente, já quase diluído nas brumas do tempo. Mas há uma diferença entre o que pertence a um passado muito distante e aquilo que ainda ronda nossos calcanhares. Fatos longínquos dependem de especialistas, de estudiosos, de historiadores, para serem desvendados. Fatos recentes dependem de provas que não foram destruídas e de depoimentos, pois nem todas as pessoas envolvidas puderam ser eliminadas. Portanto, neste momento, é importante que se jogue a luz necessária para clarear os porões. Já não se trata mais de uma caça às bruxas, pois todas foram anistiadas, mas apenas de nomear e responsabilizar os falsos poderosos, para que a história real permaneça viva, a ponto de jamais se repetir. Parabéns ao jornalista pelo excelente trabalho.
ResponderExcluirSílvio Ferreira Leite - Escritor
Gostaria de te parabenizar pessoalmente. Por internet não é possível fazer como se deve quando um trabalho é excepcional: nesse caso, deve-se cumprimentar de pé!
ResponderExcluirAntônio Mário - Taubaté - SP
Tô adorando teu blog! Jornalismo crítico e contundente. Documental e filosófico.
ResponderExcluirCristiano Karnas - São Paulo
O que aqui está revelado, documentado e da maneira como foi exposto é verdadeira obra jornalística e histórica. O resgate da informação é importante por quem a testemunhou. Lição e exemplo. A mídia comete pecados ao não dar relevância merecida a determinados fatos e acontecimentos. Sabemos de outras façanhas que o autor poderá ainda nos revelar.
ResponderExcluirAdroaldo Giusti - Porto Alegre - RS
Este depoimento-reportagem merece estar em livro.
ResponderExcluirGiovana Filgueiras - RJ
Seria conveniente a CNBB e o clero gaúcho dedicarem atenção ao que aqui está revelado e exposto. O que seriam os documentos secretos do Vaticano à época?
ResponderExcluirGeraldo L. Marchetti - Porto Alegre - RS
O fato e os bastidores dele, da forma como foi contado, é fantástico. A documentação apresentada deve ser agregada à outras que vão delineando o mosaico da nossa história recente. O apanhado das ocorrências no ano de 1969 dá dimensão do quanto ele foi intenso para os brasileiros. Importante documento esse.
ResponderExcluirIsaias F. Quevedo – Curitiba - PR
Providencial resgate de fato que integra o conjunto de acontecimentos da nossa história recente. Todo e qualquer testemunho dos ocorridos enriquecem a nossa compreensão desse cenário político vivenciado por pessoas. São elas que nos deixaram legados, os quais delinearam rumos e destinos da Nação que ainda deve aprender muito com o passado. Todo e qualquer fato, o mínimo historiar de acontecimentos ajuda. São resgates, como o exposto neste blog, que sinalizam quão longo ainda é o caminho a ser percorrido para a sociedade mais humana, justa e fraterna, com respeito aos direitos humanos, à liberdade de expressão e politicamente decente. O engajamento na luta por causas dignas e corretas muitas vezes faz com que sangue seja derramado. A realidade.
ResponderExcluirEdna M. Oliveira - Recife - PE
Carlos = Em 1.969 a realidade tinha como cenário a chamada "guerra fria": capitalismo X socialismo. As duas correntes perderam. 1) - A União Sovietíca se desmachou em 1.989 e até hoje Cuba está no atraso (ainda nem internet dispõe). Os Estados Unidos estão em decadência econômica. No caso do Brasil os valentes jovens que combateram o regime militar deram a volta por cima e hoje dirigem o País. Assim, o Brasil é um só e no caminho da vida a perspectiva é a mágica da sociedade aberta, democratica e de raizes das gerações pós II Grande Guerra. O seu relato do distanciado ano de 1.969 é um "bilhete" da história da Pátria e V. contribuiu com a sua mocidade de jornalista.
ResponderExcluirO momento - hoje - é outro para superar a fase de mordomias, corrupções , estagnações e projetar o Brasil de amanhã. Qunado nevar no Rio de Janeiro em consequencia do aquecimento global; quando a sociedade brasileira estiver no patamar de terceira economia mundial (na quinta já está projetada, descolocando a Italia e a França); quando a tecnologia avançar no coletivo e o ensino se qualificar; a estrutura do Brasil se equilibrar; as futuras gerações despertarem para a nova consciências e os governos do planeta dependerem do estágio ascendente de nosso País, todos nós vamos olhar o passado com respeito.
Justamente, olhar o passado com respeito, é hoje a salutar prática de brasileiros que vivenciaram ou tomaram conhecimento de idos que integram a nossa história não tão distante. Há hoje, indiscutivelmente, cenários diferentes e novamente complexos, com outros significantes. As mazelas que impregnam a nossa realidade são duradouras, impertinentes. Exigem nosso permanente esforço para mudanças. Sou grato pelo comentário do "Anônimo", postado acima. Fico a imaginar quem ele é. Talvez seja personagem ou observador próximo da história verídica relatada neste Blog. Merecer a sua atenção em sutil comentário me é enriquecedor. Ser artífice de "bilhete" da história da Pátria, como ele diz, me é compensador.
ResponderExcluirContribuímos na nossa mocidade, eu e você, caro "Anônimo". Certamente. Lamento não identificá-lo. Meu e-mail particular é visível e está à sua disposição.
Carlos Karnas - Caçapava - SP
Caro amigo,
ResponderExcluiracho que os bilhetes, as circunstâncias em que foram passados a você e a recuperação histórica daqueles dias/meses/anos ainda valem uma boa reportagem ou série de reportagens. O próprio jornal Zero Hora poderia se redimir de sua evidente omissão à época. Vale, também, um perfil biográfico de dom Vicente Scherer.
Parabéns por este balaço jornalístico.
Clovis
Chego a este blog por indicação de pessoas próximas. Surpreendo-me com o conteúdo dos artigos publicados e com a reportagem-depoimento de um acontecimento em 1969. Há seriedade, ao que tudo indica. O trabalho exposto contribui por ser documental e não deve ser diminuído, mesmo que estejamos em tempos de realidades outras. Os pequenos resgates históricos e os relatos pessoais são valorosos. Nos ajudam a, de certa forma, entender o nosso país hoje e os fundamentos que vão sendo estruturados para o futuro. Interessante perceber que há, neste momento, consistente movimento de resgate dos acontecimentos durante os regimes ditatoriais na América latina. Argentina, Uruguai e Chile também fazem as suas revisões históricas e não livram nomes de pessoas que participaram com autoridade dos anos duros e de regimes de força. Portanto, há mérito e não há nada a ser desprezado no que está publicado neste espaço do jornalista Carlos Karnas. Os comentários atestam a i9mportância do que foi escrito e mostrado.
ResponderExcluirAtílio L. Paim.
Na realidade trata-se de documento necessário para figurar na história da Pátria. Anonimo.
ResponderExcluirPrezado Karnas, ler teu texto é rever um tempo de guerra de verdade, mas cuidadosamente mantida fora do alcance do cidadão comum. Todavia, os rumores, dos fatos mantidos distantes não deixavam de revelar os estampidos, as fumças e os odores. Terminando uma graduação e me preparando para outra, como univsersitário, simultaneamente da UFRGS e da PUCS, vinha sendo informado dos acontecimentos. Muitos estudantes, professores, operários, artistas, religosos, etc., vinham sendo preseos de uma hora para outra desde 1966. Soube da morte de Marighela pelo "Diário de Notícias", um dos jornais que também lia. Naquele tempo, em Porto Alegre circulavam mais que cinco jonrais. Mas, no "Diário de Notícias", havia uma espécie de caricatura mosrtrando freis saltando de um fuca, agitando desesperadamente em fuga, os rosários... Uma insidioso factóide querendo dizer que eles tinha traído Marighela. Creio que é possível resgatar um número desse jornal que circulou naquele tempo. Viíamos amedrontados não com medo de ladrões e assaltantes que os havia, mas, com medo de policiais secretos que para mostrar serviço e serem promovidos para cargos mais rendosos inventavam denúncias. Descobríamos estudantes universitários agentes secretos de DOPS. Um ex-seminarista, conterrâneo, revelou-se para mim, como agente da DOPS, tendando obter dados de colegas. Como nada conseguisse, convidou-se a fazer parte do movimento dele (!) onde eu podia ver, dizia-me ele, que o que eles faziam era proteger os estudantes!!! Deve ter-se formado médico. Nunca soube em que paradeiro se meteu. Suspeito que tenha sido objeto de queima de arquivo, pois que no desmonte da DOPS, muitos sumiços continuam enigmáticos. Enigmático é o sumiço de capitão do exército, que também curso psicologia na PUCS. Teria se suicidado... Teu texto, sem dúvida, é um texto antológico: pela agilidade informativa precisa e pela capaciade de mostra que reportagem em "après-coup" (no relance), pode ser feita em qualquer tempo. É possível, hoje, fazer reportagens de fatos que, no seu devido tempo, não foram reportados. É um novo gênero de jornalismo ou um gênero que pode ser cada vez mais incentivado? Abr e parabens pelo texto. jlcaon@terra.com.br
ResponderExcluirFoi meu primeiro mestre no jornalismo, ao me chamar para editar minhas reportagens/matérias. Me ensinou a não deixar dúvidas no que relatava. Só posso dar parabéns a ele, pelo Blog, pelo relato precioso e me aliar aos que pedem que ele faça um livro.Karnas o relato é impactante e me levou junto dos teus caminhos naqueles dias.
ResponderExcluirNelcira Nascimento - Canoas - RS
Nelcira, há generosidade e fico sensibilizado com o teu comentário postado. És mulher de fibra e profissional digna. És combativa e atenta, ainda nos dias de hoje. Continuadamente estás a demonstrar jornalismo pelos meandros ofertados na internet. Grato pela tua leitura e interesse.
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